Arquivo de Março 2014

  • Postado por editora em Atualidades, Destaques, Entrevistas em 31/03/2014 - 13:22

    Dificilmente se compreenderá o país de hoje sem que se perceba o verdadeiro alcance do 31 de março de 1964.

    Há exatos 50 anos, quando o presidente João Goulart foi deposto, não era possível prever que esse evento inauguraria os 21 anos do regime militar no Brasil.

    O golpe não pressupunha, necessariamente, a ditadura que se seguiu. Com o apoio de expressiva parte da sociedade, principalmente da classe média urbana, da imprensa e da Igreja Católica que, anos depois, se tornariam fortes opositoras do regime, a tomada do poder pelos militares representou a expressão mais contemporânea do persistente autoritarismo brasileiro, que já havia se manifestado em tantas outras ocasiões – como no outro regime autoritário republicano, o Estado Novo (1937-45).

    Por que tantos apoiaram o golpe? Como o golpe se transformou em uma ditadura? Estaria Goulart planejando impor as reformas independentemente do Congresso Nacional por meio de um golpe de Estado? Em que consistiu o apoio norte-americano ao golpe de 1964?

    Essas e outras diversas perguntas têm suas respostas no livro 'O golpe de 1964: momentos decisivos', do professor Carlos Fico.

    Outras questões foram levantadas em um pequena entrevista que o professor Fico nos concedeu. Confira:

    jango

     

    1. É possível afirmar que às vésperas de março de 1964 o Brasil realmente caminhava para o socialismo?

    Analistas importantes, como Jacob Gorender, consideram que o Brasil vivia, na época, uma situação pré-revolucionária. Isso não me parece correto. Havia, de fato, uma dinâmica social intensa, marcada por muitas greves e reivindicações de trabalhadores. O fato de Goulart estar no poder e propor as chamadas “reformas de base” trouxe para o centro do debate político a questão da pobreza, da injustiça social. De algum modo, pode-se dizer que o golpe de 1964 decorreu do medo das elites e de outros setores sociais em relação a essa conjuntura, mas não se tratava de uma circunstância pré-revolucionária.

     

    Ai5

    2. 1968 é conhecido como o ano “do golpe dentro golpe”. A decretação do AI-5 realmente pode ser encarada como uma “revolução”? Como o senhor avalia o regime no  período entre o golpe e o decreto desse Ato Institucional?

    A expressão “revolução dentro da revolução” foi usada pelo general Costa e Silva. Ela não me agrada não apenas por causa disso, mas também porque não creio que tenha havido uma mudança de natureza do regime. Com o AI-5 houve, com certeza, uma mudança de escala da repressão, mas havia violência desde 1964. O AI-5 representou a vitória definitiva do grupo que, desde o golpe, reclamava mais punições e a continuidade do regime militar. Insatisfeitos, em 1964, com as cassações de mandatos e suspensões de direitos políticos, esses militares radicais exigiam a reabertura da temporada de punições, o que acabaram conseguindo parcialmente com o AI-2 (1965) e definitivamente com o AI-5.

     

     

    3. Como o senhor avalia a criação e a atuação da Comissão da Verdade?

    A Comissão Nacionaabaixol da Verdade foi uma boa iniciativa, algo tardia, do processo que chamamos de Justiça de Transição. Não tenho muitas informações sobre sua atuação, mas temo que a insistência em tratar dos casos mais conhecidos não seja uma boa estratégia para despertar a atenção da sociedade. Muitas pessoas que não atuavam na esquerda foram atingidas pela repressão. Se esses casos se tornassem conhecidos, talvez a sociedade se mostrasse mais interessada em conhecer aquele período. Torço para que a comissão produza um relatório impactante e revelador.

     

     

    O_Golpe_de_1964O golpe de 1964: momentos decisivos

    Carlos Fico

    Coleção FGV de Bolso | Série História

    Impresso: R$22 | eBook: 15

  • Postado por editora em Destaques em 27/03/2014 - 13:05

    Praticamente não é possível imaginar os dias atuais sem as facilidades tecnológicas que envolvem as transações bancárias.

    Como os bancos evoluíram tecnologicamente e mudaram o relacionamento com os correntistas e a maneira de usar o dinheiro é o tema tratado nessa obra, publicada originalmente pela RAE (Revista de Administração de Empresas da EAESP) em 2010.

    Tecnologia Bancária no Brasil: Uma história de conquistas, uma visão de futuro está disponível no formato eBook para download gratuito em nosso site.

    Confira alguns trechos da obra e conheça mais sobre essa história:

    "Este livro é uma provocação e um convite para que aqueles que participaram do desenvolvimento da Tecnologia Bancária no Brasil, reconhecida mundialmente como referência em inovação e qualidade, contem suas histórias. É também um desafio às novas gerações, para que continuem escrevendo essa história de sucesso.
    Os primeiros computadores começaram a ser instalados nos bancos em meados da década de 60. Naquela época o maior banco do país e símbolo do sistema financeiro era o Banco do Brasil, seus funcionários eram muito respeitados, fazer carreira no banco era o sonho de todos os bancários. Dizia-se que nas  cidades do interior eram três as autoridades: o delegado, o padre e o gerente do Banco do Brasil. O Bradesco, dirigido por Amador Aguiar, era o líder entre os bancos privados, posição que assumiu impondo uma mudança radical na forma de trabalho dos bancos, transformando-os de sisudas e fechadas instituições, com agências que mais pareciam catedrais, em instituições voltadas à prestação de serviços, com agências muito mais espaçosas, que privilegiavam as áreas de atendimento e ofereciam muito mais conveniência aos clientes."

    TecnologiaBancariaBR-1

    "O papel da TI nos bancos é dos mais estratégicos. Desenvolver um planejamento de TI em bancos tem importância fundamental, devido ao grande potencial em alavancar as atividades de negócio. Dentre essas implicações, podem-se observar
    as formas como os bancos estão implementando novos serviços ou produtos, com o objetivo de aumentar a eficiência dos negócios com a melhoria da administração das transações comerciais e as informações geradas por elas, e também as oportunidades para criação de novas áreas de negócios e novos produtos.
    Os bancos brasileiros, pioneiros na ampla utilização de recursos de TI, já identificaram há muitos anos que o futuro está na realização de Negócios na Era Digital. As pesquisas da FGV identificaram que houve um crescimento significativo
    dos investimentos dos bancos nessa área e que o novo cenário competitivo está no ambiente digital.
    O papel dos bancos, nesse novo cenário, adquire uma nova dimensão pela possibilidade de ser um dos elos da cadeia de valor que as empresas estão formando no novo ambiente, ao mesmo tempo em que essas instituições precisam ficar atentas aos desafios dos novos concorrentes. O estudo da evolução de indicadores comprova essas afirmações e permite visualizar, quantificar e analisar o processo em andamento."


    Tecnologia Bancária no Brasil: Uma história de conquistas, uma visão de futuro

    Download Gratuito

     

  • Postado por editora em Atualidades, Destaques, Entrevistas em 24/03/2014 - 15:13

    De forma organizada e objetiva, o novo livro da Série História da Coleção FGV de Bolso  apresenta os movimentos de independência e a emancipação dos escravos nas Américas. Ao longo do século XIX, a Justiça, ao mesmo tempo em que conferia alforria a escravos no continente, criava novas concepções de liberdade, categorias de raça e codificava o privilégio de brancos. Indivíduos e grupos passaram, então, a recorrer à Justiça para definir, ou contestar, sua nova condição civil.

    Neste contexto, em “Escravidão e liberdade nas Américas” as autoras Keila Grinberg e Sue Peabody analisam em detalhe casos da América espanhola, portuguesa, francesa e inglesa, possibilitando a compreensão da formação e dos meandros do processo de abolição da escravidão por todo o Atlântico.

    Além disso, a obra se propõe a abarcar o amplo processo histórico que, em quatro séculos, compreendeu o estabelecimento e a abolição da escravidão no continente.

    Conversamos com a professora Keila Grinberg sobre as principais diferenças da escravidão e da liberdade nas Américas e também sobre a importância na formação dos estudantes com as novas interpretações da escravidão que vêm sendo abordadas nos livros didáticos.

    Confira:

    "Desde a implementação da lei 10.693/2003, que torna obrigatório o ensino de História da África e Cultura Afro-brasileira nas escolas, o ensino de questões relativas à história da África e, no caso do Brasil, principalmente da escravidão vem aumentando muito. Só para descravidaoar um exemplo, no último ENEM (2013) seis questões da área de ciências humanas tiveram este tema, o que é considerado alto para os especialistas. Neste livro, pretendemos abordar a história da escravidão de maneira complexa, mostrando não apenas a realidade brasileira, mas também as diferenças e semelhanças em relação aos casos inglês, francês e espanhol. O objetivo é que os leitores possam perceber que, embora a escravidão nas Américas tenha características comuns onde quer que tenha ocorrido, é importante atentar para as especificidades de cada caso também. Neste sentido, é importante afirmar que a escravidão é um regime extremamente duro e violento, em qualquer época e lugar. Mas, ao mesmo tempo, as possibilidades de obtenção da liberdade por escravos individualmente variaram a cada caso. Também foram diferentes os processos de abolição da escravidão em cada região. Da mesma forma, a centralidade do papel exercido pela escravidão em cada sociedade variou. No Brasil, por exemplo, a escravidão é central para a compreensão das sociedades colonial e imperial."

     

    Escravidão e liberdade nas Américas

     

     

    Escravidão e liberdade nas Américas

    Coleção FGV de Bolso | Série História

    R$22

     

     

  • Postado por editora em Atualidades, Entrevistas, Eventos em 18/03/2014 - 13:08

    Por meio de novas abordagens, relativamente recentes, e não apenas no Brasil, os arquivos pessoais ganham cada vez mais importância no campo da própria arquivologia e também no das pesquisas em áreas do conhecimento como história, literatura, sociologia e antropologia.

    Tratado até pouco tempo como um “não lugar”, na medida em que para muitos arquivistas e pesquisadores os arquivos pessoais simplesmente não eram arquivos, esse tema ganha um novo status e passa a ter importância estratégica nos diversos campos das ciências sociais.

    Numa reunião de textos organizados pelas professoras Isabel Travancas, Joëlle Rouchou e Luciana Heymann, Arquivos pessoais: reflexões multidisciplinares e experiências de pesquisa demonstra como, "a partir da pesquisa em um arquivo pessoal específico, é possível fazer achados de diversos tipos, bem como ter acesso privilegiado às diferentes estratégias de colecionar e registrar “vidas”, evidenciando não só por que os titulares “guardam” documentos, mas que práticas utilizam para fazê-lo".

    Com o lançamento marcado para amanhã, dia 19 de março, as organizadoras da obra responderam a 3 perguntas nossas. Confira:

     

    1.      Quais são as principais contribuições dos textos apresentados para a disseminação de novas informações sobre personagens e épocas acessíveis através de arquivos pessoais?

    Uma das contribuições mais importantes deste livro é jogar luz num campo antigo da área de história – as trajetórias de vida - que vem ganhando mais relevo pelo fato de não ser mais apenas um terreno de historiadores. Outro aspecto importante é a reflexão inovadora sobre esses artefatos presente em vários artigos. Trata-se de um conjunto de textos de pesquisadores brasileiros e estrangeiros que trabalham com arquivos pessoais muito diversos - de artistas, de políticos, de escritores, de jornalistas, de anônimos, de historiadores e antropólogos - e em suportes distintos, não só o papel como também o arquivo digital. Eles ajudam a compreender contextos e personagens a partir dos conjuntos documentais que acumularam, mas também de "migalhas", anotações à margem, critérios de ordenamento dos papéis etc..

    2.      Qual a principal importância para a história e demais campos das ciências sociais do acesso aos arquivos pessoais?

    Os arquivos pessoais são uma fonte preciosa de conhecimento de épocas, episódios e pessoas para muitas áreas.  Eles são em geral resultado de uma vida e ajudam a entender seu "titular".  Sejam seus diários ou cartas, suas anotações nos livros ou seus documentos e obras. Para os historiadores, em especial, é um campo rico e delicado uma vez que envolve trajetórias pessoais, redes de sociabilidade, projetos, subjetividades e contradições.

    3.      Em tempos de grandes discussões sobre biografias , como vem sendo encarado o acesso aos documentos de arquivos pessoais e às publicações neles baseadas?

    Os arquivos pessoais em geral são vendidos ou doados por seu titular ou herdeiros para instituições de guarda, como arquivos, bibliotecas, museus e centros culturais. Muitas vezes, eles são o ponto de partida para a criação de uma instituição. Portanto eles já chegam às instituições tendo sido avaliados por seus proprietários e autorizada sua consulta..  As biografias se constroem a partir de muitos elementos: entrevistas, pesquisa em periódicos, em arquivos diversos e em arquivos pessoais. Estes são um elemento na teia de registros sobre o e do biografado. É evidente que o titular e sua família têm direito sobre ele e de fazer o uso que desejarem. Por outro lado, é legítimo que pesquisadores e biógrafos queiram ter acesso aos arquivos de personalidades para construir suas trajetórias e apresentá-las um público mais amplo.

     

                        O lançamento é nesta quinta, na Livraria da Travessa. Todos convidados!

    Arquivos_pessoais

     

    Arquivos pessoais: reflexões multidisciplinares e experiências de pesquisa

    Editora FGV

    Isabel Travancas, Joëlle Rouchou e Luciana Heymann

    R$45

     

     

  • Postado por editora em Atualidades, Destaques, Eventos em 17/03/2014 - 19:19

    Entre os inúmeros eventos, programas e especiais promovidos nas mais diversas mídias sobre os cinquenta anos do golpe militar de 1964 durante esse mês, a Editora FGV lança o livro O golpe de 1964: momentos decisivos, do professor Carlos Fico.

    Elaborada dentro da Coleção FGV de Bolso, a obra relata ao leitor alguns antecedentes do golpe de 1964, da inesperada chegada de Goulart ao poder e da crise política que antecedeu sua derrubada. O autor também aborda o golpe em si e os momentos dramáticos vividos pelo Brasil no final de março e início de abril daquele ano e ainda demonstra como o “golpe” virou “ditadura”, isto é, como o evento de março de 1964 tornou-se o inaugurador do mais longo regime autoritário do Brasil republicano.

    O lançamento do livro será no dia 18 de março, terça-feira, às 19h30, quando o autor promoverá um bate-papo com todos os presentes sobre esse evento tão importante em nossa história.

    Confira algumas palavras do professor Carlos Fico sobre sua obra:

    "Este é um livro pensado para o grande público, não tem natureza acadêmica. É um formato muito adequado para a manifestação mais “livre”, por assim dizer, de nossos pontos de vista, sem as amarras por vezes asfixiantes do formato universitário. Não vou recheá-lo com notas explicativas e bibliográficas, embora, para escrevê-lo, eu me ampare no conhecimento histórico acadêmico de alto nível que temos hoje no Brasil. É realmente notável como a historiografia brasileira evoluiu nos últimos 30 anos, especialmente no que diz respeito aos estudos sobre a história do Brasil republicano e, singularmente, sobre a história do regime militar. Isso certamente expressa o crescente interesse da sociedade brasileira sobre aquele período. Lembro-me de que, em 1994, quando do aniversário de 30 anos do golpe, poucos se interessaram pelos eventos que promovemos na universidade. Dez anos depois, em 2004 – marco dos 40 anos –, a imprensa acompanhou atentamente nossos seminários acadêmicos. Agora, nos 50 anos do golpe, o interesse é maior, inclusive em função dos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade. Mas eu falava da historiografia: uma pequena bibliografia sobre o tema pode ser consultada no final do volume. Naturalmente, vou me basear também em minhas próprias pesquisas – e os raros leitores que já me conhecem saberão identificar uma ou outra evolução, uma que outra mudança de ponto de vista, pois tenho me beneficiado muito não apenas das pesquisas feitas por diversos colegas, mas também daquelas conduzidas pelos bacharelandos, mestrandos e doutorandos que tenho orientado – meus queridos alunos aos quais dedico este livro."

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    O golpe de 1964: momentos decisivos

    Carlos Fico

    Coleção FGV de Bolso | Série História

    Impresso: R$22

    eBook: R$15

    Arquivos:
  • Postado por editora em Destaques, Entrevistas, Eventos em 12/03/2014 - 12:51

    Ao longo da época moderna, milhares de recém-nascidos eram abandonados por suas famílias, fosse em instituições de acolhimento - com as conhecidas "rodas dos expostos" -, fosse nas soleiras das portas de estranhos.

    'A piedade dos outros: o abandono de recém-nascidos em uma vila colonial, século XVIII', do professor Renato Franco, trata do abandono de recém-nascidos em Vila Rica (hoje Ouro Preto), onde, como em muitas cidades católicas de então, era corriqueiro encontrar, ou ouvir falar de "enjeitados".

    Com o lançamento do livro marcado para esta quinta, dia 13, na Livraria FGV, o autor respondeu a 3 perguntas nossas. Confira:

     

    00_f0004_YYH61. Em seu livro, o senhor afirma que em todas as épocas da humanidade houve abandono. Qual a especificidade do período estudado em seu livro?

    Realmente o ato de abandonar os próprios filhos, muitas vezes por motivos banais, encontra relatos em diferentes épocas da história.  Muitas histórias de abandono faziam parte, inclusive, do imaginário popular, como o relato bíblico de Moisés, ou a história dos dois órfãos – Rômulo e Remo – que teriam sido alimentados por uma loba e, mais tarde, fundado a cidade de Roma. Mas se olharmos em retrospecto, o século XVIII pode ser apontado como o primeiro século de um enjeitamento em massa de crianças: do ponto de vista social, as práticas se alternavam e, especialmente o infanticídio – ato de matar a prole – foi sendo deixado de lado em favor da ideia do abandono. Ao mesmo tempo, as instituições de acolhimento que vão se sedimentando por toda a Europa e nos espaços coloniais faziam questão de manter o sigilo como condição imprescindível do abandono. Assim, na virada do século XVII para o século XVIII é possível constatar o aumento considerável de crianças enjeitadas, em índices que, muitas vezes, ultrapassavam os 20% dos nascidos. Não é puramente retórico, estamos falando de milhares de recém-nascidos que eram descartados pelas famílias e passavam a viver na casa de outros ou em instituições. Acho que é possível falar de uma verdadeira banalização do ato de abandonar, desresponsabilizando os pais. Claro que, em muitos casos, as famílias não tinham condições efetivas para criarem seus filhos, mesmo que quisessem, mas o fenômeno do abandono não se resumia a isso, muito pelo contrário. A atitude de abandonar passou a ser condenada e deixou de ser utilizada por algumas parcelas da população a partir do século XIX, mas demorou bastante para que o abandono se tornasse episódico. No Brasil, por exemplo, a última roda dos expostos data de meados do século XX.

     

    2. No caso estudado, a câmara se negou, a princípio, a pagar a criação de enjeitados mestiços. O que determinava a lei em relação aos enjeitados?DSC_0008

    Em todo o império português o financiamento dos expostos estava regulamentado desde o século XVI, com as chamadas Ordenações Manuelinas: era, em tese, uma obrigação das câmaras municipais, que, inclusive poderiam lançar impostos sobre a população para que custeassem a criação de todos os expostos até que completassem os sete anos de idade.  Na América portuguesa, esse era um assunto controverso e muitas vezes negligenciado, em parte porque o financiamento universal dos expostos dizia respeito também a mestiços. Em Vila Rica nunca houve uma “roda dos expostos” que centralizasse o acolhimento de recém-nascidos; as crianças eram deixadas nas soleiras das portas, nas igrejas e ruas de maior movimento. Mas o maior empecilho inicial foi a relutância da câmara em financiar os enjeitados mestiços, porque considerava que a ajuda aumentaria o número de abandonados e que esse tipo de auxílio deveria se resumir a famílias brancas e honradas.  Até agora, esse tipo de conflito pôde ser constatado, além de Vila Rica, em Mariana e em Recife.

     

    3. Mas, segundo seu livro, houve muitas vilas que sequer instituíram o auxílio...

    Sim, em muitas vilas e arraiais não houve auxílio, o que revela o caráter popular do abandono como prática social. A criação dos enjeitados era compreendida como uma tarefa comunitária, ou dos “outros”, como sugere o título do livro. No momento do nascimento o mais importante era o batismo como garantia da salvação da alma. Depois, o cotidiano do abandono conservou traços mais práticos: caso não pudesse mais ficar com o enjeitado, a família que o acolheu repassava-o para outras tantas quanto necessárias, havendo casos de crianças que circulavam por diversas famílias até poderem viver de forma mais independente.

     

                               O lançamento é nesta quinta, na Livraria FGV. Todos convidados!

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    A piedade dos outros: o abandono de recém-nascidos em uma vila colonial, século XVIII

    Renato Franco

    R$38