Rubem César Fernandes nasceu em uma família protestante de Niterói (RJ) em 25 de maio de 1943. Cursou história na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Foi exilado após o Golpe Militar de 1964. Na Polônia, cursou o mestrado pela Universidade de Varsóvia e participou do movimento político “Solidariedade”. Perseguido na Polônia em seguida aos eventos de março de 1968, foi para os Estados Unidos e doutorou-se pela Universidade de Columbia. Foi professor visitante na Universidade de Columbia (Nova York) e na Maison des Sciences de l’Homme (Paris). De volta ao Brasil, atuou como professor de antropologia na Universidade de Campinas (Unicamp), no Museu Nacional da UFRJ e em outras universidades brasileiras. Foi secretário executivo do Instituto de Estudos da Religião (Iser). Atualmente é diretor executivo do Viva Rio no Brasil e no Haiti. É autor de vários livros e artigos. É pai de três filhos.
Neste breve currículo, o leitor pode perceber que a biografia do professor Rubem César será uma viagem.
Saindo de Niterói, sua cidade natal, ele passa pelo Rio, por Varsóvia, por Nova York, por Campinas, retorna ao Rio e parte para Porto Príncipe no Haiti. Ao fazer isso, nosso ator vai se deslocando no espaço, no tempo e na hierarquia social até chegar ao que é hoje: conhecido como um homem do Viva Rio e reconhecido como um dos mais importantes atores/empresários de movimentos e causas sociais.
Os depoimentos registrados pelas professoras Lucia Lippi Oliveira e Dulce Pandolfi, ambas do CPDOC, narram experiências resultantes da interação entre entrevistadoras e entrevistado.
Na saída do Rio em direção à Varsóvia, nos anos de 1960, e nos dias de hoje, já estabelecido no Rio - registros contextualizados nos respectivos capítulos da obra - duas indagações das professoras ao biografado podem dar uma dimensão da história que publicamos. Confira:
Seu trem era em direção a Viena ou Paris?
Em direção a Paris, passando por Berlim. Só fui sair da cabine lá na frente, em terras “ocidentais”. Atravessei a Polônia, a Alemanha Oriental, depois Berlim Ocidental, depois Alemanha Oriental de novo, depois Alemanha Ocidental, e aí você está na liberdade. Passei uma noite inteira trancado na cabine. Então foi assim que saí da Polônia, a troco de uma garrafa de vodca. Uma pequena corrupção socialista.
Como você vê o cenário de hoje quando as ONGs brasileiras tradicionais, importantes, estão com dificuldade de obter financiamentos?
Eu acho que mudou o cenário e que, se você não mudar junto com ele, você morre. É um jogo cruel, darwiniano. Onde vejo que há campo de renovação e de continuidade? Há vários. Vou mencionar apenas o que o Viva Rio tem feito. São dois movimentos, um interno, outro externo.
Em primeiro lugar, evoluímos de uma organização que defende causas sociais para uma prestadora de serviços. Não esquecemos as causas, é evidente. São elas que formam a nossa identidade, com ideias como a da integração da cidade, da inclusão social pela cidadania e a educação, da superação da violência pela via de uma política de segurança democrática, da formação de uma cultura de paz. Em nosso início, quando perguntavam... “O que faz o Viva Rio?”, respondíamos numa expressão breve: “O Viva Rio faz paz!”.
A resposta é ainda válida. Os valores são os mesmos, mas o desafio do momento é fazer acontecer, ir além do anúncio dos princípios ou das denúncias, e contribuir positivamente para que as mudanças aconteçam. O contexto mudou, e nós mudamos com ele, sem perder o conteúdo da marca. A missão, os valores e as competências acumuladas nos permitem prestar serviços diferenciados justamente naqueles ambientes mais difíceis, onde prevalecem ainda a pobreza, a discriminação e a violência. No estado do Rio de Janeiro, trabalhamos em mais de 50 municípios, e na cidade do Rio gerenciamos programas que alcançam diretamente mais de 1 milhão de moradores de favela cadastrados. Crescemos, sobretudo, no campo da saúde pública, com a Saúde da Família, as UPAs (Unidades de Pronto Atendimento), os programas de Saúde Mental e a assistência a moradores de rua dependentes de drogas. Crescemos também com a educação para o mercado de trabalho, com o “Jovem Aprendiz”, e nas parcerias com as forças de segurança pela pacificação de comunidades conflagradas. Com tudo isso, o Viva Rio tem hoje mais de 6 mil funcionários com carteira assinada. A missão segue viva e atual, mas as atividades, os resultados e os meios transformaram-se profundamente. Os desafios da gestão, da logística e da transparência ganharam dimensões que de início sequer imaginávamos. Somos avaliados agora não apenas pela pregnância de nossas intenções, mas pelos resultados produzidos, seu impacto e sua qualidade. Perdemos, em consequência, uma boa parte daquela liberdade dos inícios voluntários e não governamentais. Funcionamos hoje pela obrigação dos contratos e somos responsáveis pela execução de orçamentos importantes. O espírito voluntário continua sendo vital, marca identitária, mas a eficiência dos processos e a qualidade dos produtos, em ambientes particularmente difíceis, como sempre, é o que nos gratifica ou condena. Compartilhamos a gestão de políticas públicas, junto a prefeituras e a governos estaduais. Guardamos a independência no pensamento e na gestão, mas nos aproximamos dos gestores públicos. (...)
O livro Fora de ordem: viagens de Rubem Cesár traz as experiências e relatos "sobre vida e a extraordinária obra de um grande e raro cidadão brasileiro", nas palavras do cineasta Zelito Viana, que assina a orelha da obra.
O lançamento será no dia 16 de outubro, na Blooks Livraria | Rio. Todos convidados!
Fora de ordem: viagens de Rubem César
Org: Lucia Lippi Oliveira e Dulce Padolfi
Impresso | R$52