Ensaios de grande estratégia brasileira

Ensaios de grande estratégia brasileira reúne cinco capítulos sobre a articulação entre as políticas externa e de defesa do país, em que o autor enfatiza a necessidade inadiável de retirar o Exército do pântano da segurança pública, condição sine qua non para implementar uma grande estratégia coerente - e para enfrentar de maneira efetiva a ameaça do crime organizado.
Este livro será de grande valia para todos os interessados em política externa, defesa, segurança internacional, história e ciência política, bem como para qualquer cidadão preocupado com o futuro do Brasil.

Confira o prefácio da obra:

Se alguém ainda nutrir suspeitas sobre a acuidade da difundida frase “O Brasil é o país do futuro, e sempre será…”, ler o penetrante livro de João Paulo S. Alsina Jr. removerá rapidamente qualquer dúvida. O autor redigiu os cinco capítulos de seu livro durante o período 2010-2017, intervalo de tempo em que completou seu doutoramento, publicou um importante livro sobre o barão do Rio Branco e vários artigos sobre forças armadas e defesa, além de ter contribuído com diversas publicações.
Os primeiros dois capítulos do seu novo livro, sobre o conceito de grande estratégia e o atual panorama da segurança internacional encarado a partir da perspectiva brasileira, são extremamente bem documentados com as fontes mais recentes e relevantes. Os três capítulos seguintes são ensaios em que o autor se baseia em insights únicos, derivados de sua condição de diplomata e de um dos mais conceituados experts em diplomacia brasileira, defesa e relações civis-militares. João Paulo Alsina não teve alternativa senão escrever esses três capítulos - sobre segurança nacional e defesa, o Brasil e as operações de paz, e a conscrição no país - como ensaios, tendo em conta haver muito pouca literatura acadêmica útil e objetiva sobre esses tópicos. Há documentos oficiais sobre essas matérias, mas uma das bêtes noires do livro é justamente a recaída naquilo que o autor classifica como "oficialismo” - a tendência à confirmação acrítica - pelos estudiosos do mofado status quo burocrático. O contraste entre, de um lado, o que autores estrangeiros, como Hew Strachan, seguidores de Carl von Clausewitz, têm a contribuir sobre a formulação da grande estratégia e o “pacto da mediocridade” prevalecente no Brasil sobre esse tema, de outro, é alarmante.
No grupo dos três capítulos anteriormente mencionados, em realidade ensaios, Alsina demonstra claramente que o Brasil não tem uma estratégia. 
Caso o status quo atual não seja alterado: a grande estratégia do país continuará a ser caótica e totalmente incapaz de reunir sinergicamente os ativos de poder nacionais em torno de um projeto viável de inserção soberana no mundo. Ao que tudo indica, o Brasil permanecerá sendo um ator menor no plano da segurança internacional, munido de retórica diplomática totalmente desconectada de capacidades materiais correspondentes. O tão almejado assento permanente no CSNU, mantidas as condições atuais, será apenas mais um sonho de uma noite de verão.
No capítulo três, João Paulo Alsina trata das instituições, no Brasil, que deveriam ser instrumentos de implementação da grande estratégia, que para o autor precisariam incluir o Exército Brasileiro. Contudo, devido ao recurso constante ao Exército na segurança interna, na verdade em tarefas policiais, a infame garantia da lei e da ordem (GLO), e a tremenda relutância em utilizar o poder militar externamente, não há disposição política para apoiar financeiramente as Forças Armadas nem incentivos reais para que os decisores brasileiros se envolvam ou desenvolvam expertise em temas relacionados com a segurança lato sensu e com a defesa.
No quarto capítulo, Alsina demonstra de modo percuciente, em clara contradição com o oficialismo, que a imersão superficial do Brasil em operações de manutenção da paz, como no Haiti por meio da Minustah, levada a cabo entre 2004 e 2017, não é o caminho para o aumento do reconhecimento
internacional do país. Ele desbanca mitos, que infelizmente são comuns no Brasil mesmo entre acadêmicos, sobre as implicações da participação nessas operações. O autor revela que também nessa área, assim como em outras, inexiste uma estratégia — e o faz a partir da sua experiência no
interior do aparato estatal, já que fez parte da missão do Brasil junto às Nações Unidas e, nessa condição, se ocupou da temática das operações de paz.
No quinto capítulo, sobre o recrutamento militar, o que na maior parte dos países equivaleria a objetivos secundários do sistema de conscrição, no Brasil adquire papel preponderante: o resgate de hipotecas sociais. Em consequência, geram-se forças totalmente despreparadas para o combate.
João Paulo Alsina demonstra que, no Brasil, a incorporação de recrutas às fileiras das FFAA encontra-se muito mais pautada por uma lógica assistencialista/clientelista do que por uma lógica instrumental que conceba o sistema de recrutamento como ferramenta de absorção do contingente melhor talhado para o desempenho dos labores guerreiros. Assim, a maximização do poder combatente das Forças […] encontra-se politicamente subordinada ao desempenho por parte destas de funções subsidiárias que possam ser instrumentalizadas pela lógica do particularismo.
O tema que unifica todo o livro é o de que os decisores civis no Brasil, ao não reconhecerem a necessidade de os militares desempenharem funções que vão além de tarefas policiais ou ações cívico-sociais, não precisam verdadeiramente de uma estratégia — e, na verdade, nem sequer a desejam. O resultado é um círculo vicioso. João Paulo Alsina enumera três hipóteses de superação do presente conundrum, mas é pessimista quanto à probabilidade de que alguma delas venha a ser materializada devido à total falta de compreensão e de interesse civil em estratégia e na sua interface com as Forças Armadas. Nas suas palavras: “a mais formidável de todas [as barreiras] seja de ordem cognitiva. Não se muda aquilo que não se conhece, e não se conhece algo sem amor ao conhecimento e ao estudo sistemático”.
Este livro, ainda que extremamente crítico, encontra-se fundamentado em realidades que o autor conhece em profundidade. Similarmente, observadores estrangeiros bem informados, cansados da retórica vazia sobre a singularidade brasileira, estão crescentemente atentos aos problemas abordados por Alsina. Com este trabalho, espera-se que mais brasileiros compreendam a problemática da segurança nacional e adquiram conhecimento voltado à superação dos imensos obstáculos à construção da estratégia definidos e analisados pelo autor.
Que um brasileiro, e diplomata ainda por cima, escreva e publique um livro como este é encorajador. Em Ensaios de grande estratégia brasileira, João Paulo Alsina realiza uma análise que precisa ser considerada seriamente.
Thomas C. Bruneau
Professor emérito, Naval Postgraduate School, Monterey
EnsaiosDeGrandeEstrategiaBrasileira

 

Ensaios de grande estratégia brasileira

João Paulo Soares Alsina Júnior

Editora FGV

Este conteúdo foi postado em 11/07/2018 - 10:23 categorizado como: sem categorias. Você pode deixar um comentário abaixo.

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